sábado, 16 de julho de 2016

Douglas Adams, você é um rato! Obrigada pelos peixes

17.7.2016
Se há algo que posso garantir a você é que desde a minha mais tenra adolescência, com todas as minhas dificuldades de entendimento da linguagem comum dessa geração que participei, e suas formas de agir também, dificultando muito o meu acesso a ela e dando-me status de esquisita é que eu sempre tive muita facilidade para montar imagens mentais. Sim, isso mesmo. Parece estranho, mas pense, quando falamos coisas e descrevemos coisas, quando contamos piadas – como a do dedo sangrento, lembra Cleide? – a nossa cabeça recebe uma carga visual da oralidade que é a pessoa falando para você daquilo, e não aquilo que realmente está falando está acontecendo. É nesse momento que a minha cabeçona liberta-se e corre para criar imagens mentais que cumpram com aquelas tarefas visuais, acompanhando a narração oral que recebo.
Você pode ver que depois, nessa mesma época usei dessa capacidade para criar imagens poéticas as vezes pedantes noutras bonitas, todas hiperbólicas, mas que conseguem atingir muito do público em relação ao que pretendia desenhar na cabeça deles. Me senti a vontade para fazer isso na poesia, pois as pessoas faziam isso comigo diariamente, sem dificuldade, me forçando às incongruências que encontrei no meu desenvolvimento psico-social e emocional.
Conhece Douglas Adams foi encontrar uma alma gêmea. Ele além de colocar imagens na minha cabeça, falava das imagens da cabeça dele em seus livros, e para tentar fazer isso ser mais didaticamente ridículo ainda usou em sua trilogia de cinco que tanto amo uma enciclopédia para guiar os mochileiros pela galáxia. Até então não havia me dado conta de que isso era algo comum. Claramente eu era uma ridícula que acreditava que poucos podem entender o que ele escreve, e na verdade.... entender como eu entendo é a pura verdade, mas você sabe que todos podem entender.

Foi quando o seu livro Póstumo “Salmão da dúvida” foi publicado, ano em que fiz a minha tatoo dedicada ao guia, e ao Douglas, é claro. Não fazia muita ideia do que haveria em seu conteúdo e hoje posso falar que cheguei à página 30 e ainda não sei bem o que ele terá. Sei que há compilado de cartas, provavelmente o prometido livro o Zaphod, meu personagem preferido, e outras coisas, mas houve também a nota do editor e a introdução.
Na introdução Stephen Fry diz:
“Quando você vê uma ilustração de William Blake, ouve Bach, lê Douglas Adams ou assiste a uma apresentação de Eddie Izzard, tem a impressão de que talvez seja a única pessoa da face da Terra que os entende de verdade. [...] Quando você lÊ uma frase especialmente brilhante de Adams, sua vontade é cutucar o ombro do estranho mais próximo e mostrar para ele. O estranho pode até rir e parecer gostar do que está escrito, mas você se agarra À ideia de que ele não entendeu exatamente a força e a qualidade do texto, não tanto quanto você – da mesma forma que seus amigos não se apaixonam (graças a Deus) pela pessoa sobre a qual vocE não para de falar um minuto.”

Pois é, é muito bom se identificar individualmente com um cara como o Douglas Adams, homem que é minha alma gêmea, mas não me conheceu. Se me conhecesse, talvez eu fosse outra pessoa, mas sabe o que é melhor? Ele é e pronto, indiferente da sua certeza, ah, e ele é a alma gêmea de um monte de leitor por aí, pode crer.
Entrar nesse universo das cartas que iniciam o capítulo VIDA foi um gozo que poucos amantes me causam, só posso falar publicamente dos senhores Machado de Assis, Edgar Alan Poe e Lygia Fagundes Telles por enquanto. Há muito mais gozos, mas estes conseguem frequentemente... não se esqueçam do Stephen King!
Encontrei um ponto de identidade com ele na carta inicial, na qual ele tinha só 12 anos, e é bem a minha idade em relação a uma das identidades ligadas a questão desta identificação que tive com ele: aos doze ele conhecia Beatles, mas não sabia que o mundo feito de shows era possível, e por isso não foi a nenhum show dos Beatles, pois não saia que podia ir. Eu não sabia que podia ir à biblioteca e tirei nota vermelha por não ler o pequeno príncipe. Ah, como é difícil ser criança e não saber de coisas importantes para nós e que ninguém nos diz por ser tão obvias que só os muito apaixonados ou necessitados (meu caso) não veem.
Douglas Adams e seu monumental nariz
Depois ele vem, em outra carta, e fala do seu nariz. Parece constranger-me: “como ele sabia que eu acho o nariz dele enorme?”, mas ele sabia! E ele conta as suas mazelas nasais e diz que com toda aquela realeza de narinas ele não conseguia respirar. Não darei spoiler, mas ele me vez ver essa cena: “vários otorrinolaringologistas embarcaram em grandes expedições espeleológicas pelas minhas cavidades nasais e a maioria voltou perplexa. Os que não voltaram perplexos nunca voltaram, portanto são parte do problema, não da solução”. Cara, cara, num dá, estou rindo de madrugada imaginando os otorrinolaringologistas encaveirados nos túneis dessas narinas, tipo Indiana Jones, impedindo a passagem de ar que ainda era feita antes de sua incursão narina adentro. Obrigada Douglas Adams, vc é um maldito rato e eu não passo se um golfinho, é duro dar Adeus, mas obrigada pelos peixes!

PS: vc comprou o seu livro? Se já comprou, onde foi? Em uma loja virtual ou física? Eu procurei em várias das físicas na época do pré-lançamento. Recomendo que quem ainda não comprou vá procurar antes em loja física e viva a experiencia de não ser nada entendido pelos vendedores comuns, e constrangedor. Para mim isso é como uma homenagem a ele, que pensou nesse nome para causar essa estranheza (incongruência) e levar-nos para além de nos divertir. 

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